Boa noite, Marco Antonio Peixoto.
Obrigada por sua leitura atenciosa.
Seus pertinentes questionamentos, me deixam à
vontade para contar-lhe algumas coisas.
Através
do Professor/Orientador
Antonio José de Souza, conheci a potencialidade da escrita autobiográfica. Ao ler o meu memorial formativo, ele me
sugeriu escrever e publicizar a minha história de vida, da qual ele fará parte ETERNAMENTE.
Sou filha, neta, bisneta e tataraneta de agricultores(as)
negros(as). De de meus 18 tios(as), apenas uma, a mais nova “in memoriam”, frequentou
à escola. Na infância, por diversas vezes, ouvi das professoras que “ eu
morreria como meus pais, trabalhando apenas no cabo da enxada”.
Para mim isso não é um demérito. Mas, eu sonhava
em continuar os estudos e escolher a minha profissão, por aqui, um destino
recaia sobre nós mulheres negras da roça “ migrar para a capital e virar empregada
doméstica”. Todas as minhas tias seguiram esse trajeto. “ Para mim era um
destino certo”.
Consegui estudar na escola da cidade, sofri
com o impacto da mudança de sair de uma escola da roça para uma escola da
cidade, sofri também pela comparação inferiorizante entre as vestimentas,
calçados, materiais escolares, meu sotaque na fala e cabelo crespo, apelidado
de “cabelo bombril, de vassoura, duro e ruim”. Sofri também, pelo atrelamento
de que por ser da roça “eu não aprendia”.
Conclui o curso de magistério e passei anos
resistindo a migrar, precisei “vender o dia”, trabalhar sob o sol escaldante,
das 7h às 16h em propriedades de fazendeiros. Anos se passaram, fiz concurso
público e passei! Tornei-me professora.
Digo-lhe que, permanecer na escola foi difícil
e tem sido até os dias de hoje no mestrado. Os preconceitos
enfrentados durante a infância e a juventude ainda estão presentes! Mas, consciente das
identidades e culturas do campo/roça, tenho feito o entrelace entre a vida-profissão
e a formação, busco desenvolver práticas antirracistas, de respeito à diversidade e valorização da realidade local.
Eu tenho lutado... E me aquilombado com muita gente boa!
Gostaria de perguntar-lhe:
Você já sofreu ou presenciou algum episódio preconceituoso na escola?
Você concorda que a escola é negligente com a educação para a relação étnico-raciais?
Abraços.
Ana Maria Anunciação da Silva.