Diferença entre não-conjunção e não disjunção

Diferença entre não-conjunção e não disjunção

por Ana Cristina Fricke Matte -
Número de respostas: 0

Copio aqui a pergunta feita no espaço de comentários livres, para que não se perca, pois é útil para todo mundo:

  • Imagem de Lillian BernardesLillian Bernardes - 19 out, 15:01
     
    Boa tarde Professora espero que esteja bem.
    Referente ao assunto Nível narrativo, qual a diferença sutil em não-Disjunção x não-Conjunção, eles me pareceram bem correlacionados.
    Desde ja agradeço,

Bom dia, Liilian!

Obrigada pela ótima pergunta!

Vamos ver isso com mais detalhes quando formos falar do quadrado semiótico, mas você está certa: é mesmo importante saber desde já.

A diferença parece sutil se pensamos no quadrado como um esquema em que existe uma gradação entre dois eixos:

de A para B passamos por não-A

de B para A passamos por não-B

Se fosse só isso, você tem toda razão: seria irrelevante ter um nome diferente para o ponto de passagem, porque então um quadrado e não um triângulo?

Vejamos!

Tudo começa num eixo semântico, no caso o eixo semântico da Junção, tendo num extremo a conjunção e, no outro, a disjunção.

Mas, bem sabemos, é difícil pintar o mundo de preto e branco sem mudar totalmente sua realidade, ou seja, o mundo não é binário. A linguagem trabalha com identidade e diferença, o que nos coloca, muitas vezes, a pensar o mundo como binário: está quente ou está frio? Todos nós, porém, sabemos que se eu disser que está frio, pode estar tépido ou congelante, dentre outros, enquanto, se disser que está quente, pode estar morno ou queimando, por exemplo. Quando Greeimas propôs essa organização quadrada queria mostrar que nenhum eixo semântico está livre disso, mesmo quando a língua, pro falta de aplicabilidade prática, não possui palavras que indiquem posições intermediárias (às vezes nem tem palavras para um dos dois extremos, mas podemos discutir melhor isso quando formos falar do quadrado).

Se temos uma linha entre conjunção e disjunção, podemos dividi-la facilmente em 5 posições:

  • extremo A: conjunção
  • extremo B: disjunção
  • metade do caminho: nem conjunção nem disjunção (neutro)
  • espaço entre neutro e A: mais próximo da conjunção do que da disjunção
  • espaço entre neutro e B: mais próximo da disjunção que da conjunção.

Greimas propõe que entendamos a passagem entre A e B como um percurso que envolve duas operações, as quais definem esses espaços diferenciados em torno do neutro: a operação de negação e a de implicação.

  • contrariedade: conjunção e disjunção são os termos contrários, pois estão nos extremos. Além deles, ou seja, afastando-se mais ainda do neutro, nada há, exceto uma opção em geral fictícia em que temos os dois extremos ao mesmo tempo, conjunção e disjunção: o termo complexo. Como temos a palavra morto-vivo para o eixo morte/vida.
  • negação: se negamos a conjunção, criamos uma direção: estamos nos afastando da conjunção. Então a posição criada pela negação está mais próxima da disjunção do que da conjunção. E vice-versa.
  • implicação: se a posição de não conjunção está mais próxima da disjunção, dizemos que ela implica na outra. Implicação foi a palavra usada para traduzir implication, do francês de Greimas. não sei dizer se em francês também, mas em português trata-se de uma consequência previsível, que costumamos usar como obra de uma pressuposição obrigatória, inerente e, por isso mesmo, muito rápida. Então pensamos que estar não-conjunto deve imediatamente levar a estar disjunto, só que não se trata de um conceito temporal, trata-se de um conceito lógico (Dicionário de Semiótica, p. 228). Vamos dizer que há uma tendência da não-conjunção para a conjunção, dada por dois fatores: 1. o movimento de negação faz saltar da conjunção à disjunção, de modo que, embora não tenha chegado lá, está indo em direção a ela; e 2. a proximidade entre a não-conjunção e a disjunção cria um efeito de atração, como se fosse uma gravidade entre o termo estável (disjunção) atraindo o termo instável (não-conjunção). E, claro, é a mesma coisa na implicação da não-disjunção para a conjunção.

O quadrado possui quatro posições porque as posições intermediárias não são iguais, possuem pesos e qualidades diferentes. As posições contrárias, entre os extremos do eixo, são estáveis e por isso são pontos de atração para as posições instáveis, ou seja, as posições sub-contrárias, criadas pela negação.

Gosto de dizer que a negação é um salto para longe, por isso requer energia, enquanto a implicação é um pouso, um deslizar de algo que ficou suspenso e vai repousar onde houver equilíbrio.

Exemplo rápido: quando estamos grávidos, dizemos que vamos ter um bebê. Então podemos ter um eixo opondo ser filho e ter filho:

disjunção: ser filho

conjunção: ter filho

a gravidez nega o estado de ser filho porque é pressuposta pelo estado "ter filho" (que é quando "deixamos" a posição de ser filho). Big salto, sem dúvida!

Depois que temos filho, existe outro momento em que o "perdemos", qual é? A adolescência, na qual o filho busca sua identidade e independência, nos negando a posição na qual ele é "possuído" por nós, outro grande salto.

A adolescência é pressuponente da idade adulta, em que conquistamos a independência, mas ainda somos filhos porque não somos pais. Para os pais, trata-se de um fim? Não, pois o filho, embora não seja mais possuído por ele, ainda é filho e, por sinal, pode dar-lhes netos, não é mesmo?

Claro que estou falando bem genericamente, apenas a título de exemplo. O desenho ficaria assim:

conjunção (ter filho) vs. disjunção (ser filho)

Ficou mais claro? Se ainda tiver dúvidas, vamos continuar a conversa aqui, ok?

valeu!

bjs

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